Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5004874-31.2018.4.03.6130
Relator(a) para Acórdão
Desembargador Federal LUIZ DE LIMA STEFANINI
Relator(a)
Desembargador Federal THEREZINHA ASTOLPHI CAZERTA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
29/04/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 30/04/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-
DOENÇA. INCAPACIDADE LABORATIVA. CONSTATAÇÃO. HIV. REQUISITOS
PREENCHIDOS. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ DEVIDA.
- Apesar da perícia judicial não ter constatado a incapacidade laborativa, o benefício de
aposentadoria por invalidez deve ser concedido.
- O portador de HIV, mesmo assintomático, necessita de cuidados extremos, quando submetido
ao controle medicamentoso que, por si só, causa deletérias reações adversas. E, ainda, sofre
severas consequências socioeconômicas oriundas de sua condição. Não raro lhe é negado
emprego formal, diante do preconceito que a doença carrega, dificultando a sua subsistência.
- Considerando tratar-se de incapacidade total e permanente, sem possibilidade de reabilitação,
afigura-se correta a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, conforme r. sentença.
- No caso em espécie, o autor permaneceu fora do mercado de trabalho, em gozo de auxílio-
doença, desde 2001 até 2018, quando cessado esse benefício, situação a confirmar não haver
dúvida de que enfrentaria significativas dificuldades para se reinserir no mercado de trabalho,
haja vista o longo período que ficou sem laborar, exatamente em razão da doença em questão.
- Apelação do INSS não provida.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5004874-31.2018.4.03.6130
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: ODAIR NESTEFANI
Advogado do(a) APELADO: ANDERSON FERREIRA DE MELO SILVA - SP378408-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5004874-31.2018.4.03.6130
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: ODAIR NESTEFANI
Advogado do(a) APELADO: ANDERSON FERREIRA DE MELO SILVA - SP378408-A
OUTROS PARTICIPANTES:
-R E L A T Ó R I O
Demanda proposta objetivando o restabelecimento de aposentadoria por invalidez cumulado com
pedido de danos morais, desde a data em que cessados os pagamentos (11/7/2018).
Laudo pericial concluiu pela capacidade laborativa.
O juízo a quo julgou parcialmente procedente o pedido formulado, reconhecendo à parte autora o
direito ao benefício de aposentadoria por invalidez, rejeitando o pedido de danos morais. Deferida
a antecipação dos efeitos da tutela.
O INSS apela, pleiteando a reforma da sentença, requerendo, preliminarmente, o recebimento do
recurso em seu duplo efeito e, no mérito, a reforma da sentença, sustentando, em síntese, o não
cumprimento dos requisitos legais à concessão em questão. Se vencido, requer a não incidência
dos honorários advocatícios sobre as prestações vincendas , bem como a fixação dos critérios de
juros de mora e correção monetária segundo o artigo 1º-F da Lei n. 9.494/97 (comredação dada
pela Lei nº 11.960, de 2009).
Com contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
DECLARAÇÃO DE VOTO
Com a devida vênia à eminente Relatora, entendo que no presente caso o recurso do INSS não
comporta provimento.
Com efeito, apesar da perícia judicial não ter constatado a incapacidade laborativa, entendo que o
benefício de aposentadoria por invalidez deve ser concedido.
Isto porque o HIV, mesmo assintomático, necessita de cuidados extremos, quando submetido ao
controle medicamentoso que, por si só, causa deletérias reações adversas. E, ainda, seu portador
sofre severas consequências socioeconômicas oriundas de sua condição. Não raro lhe é negado
emprego formal, diante do preconceito que a doença carrega, dificultando a sua subsistência.
Analisando estes os demais elementos contidos nos autos, o segurado faz jus à concessão de
aposentadoria por invalidez.
Este Tribunal Regional Federal da 3ª Região tem se posicionado neste sentido: rel. Des. Fed.
Tania Marangoni, AC 2015.03.99.044319-0, 8ª Turma; rel. Des. Fed. Walter do Amaral, AC
2011.61.08.007012-6, 10ª Turma, e rel. Des. Fed. Marisa Santos, AC 1999.03.99.074896-5, 9ª
Turma.
Elucidando esse entendimento, trago à colação o seguinte precedente da 3ª Seção:
AGRAVO LEGAL EM EMBARGOS INFRINGENTES. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO
ASSISTENCIAL AO DEFICIENTE. PREENCHIDOS OS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DO
BENEFÍCIO. PREVALÊNCIA DO VOTO VENCIDO. AGRAVO IMPROVIDO
1 - Possibilidade de aplicação do disposto no art. 557 do CPC, o qual não traz nenhuma ressalva
aos embargos infringentes, por conseguinte, aplicável a qualquer recurso, consoante já decidiu,
reiteradas vezes, esta C. Terceira Seção.
2 - O fato de não ter sido juntado o inteiro teor do voto vencido não impede a apreciação dos
presentes embargos infringentes, uma vez ser possível deduzir o teor da divergência a partir dos
esclarecimentos constantes da Súmula do julgamento.
3 - In casu, embora o laudo médico pericial seja conclusivo no sentido de que a autora, não
obstante seja portadora de doença do sistema imunológico (AIDS), não está incapacitada para o
trabalho, é sabido que o Magistrado não está adstrito ao laudo, podendo formar sua convicção
por outros elementos existentes nos autos, nos moldes do art. 436 do CPC. Para o
reconhecimento do requisito da deficiência, é necessário levar em consideração que a
incapacidade que acomete a Autora é agravada pela sua condição socioeconômica, pela sua
idade, pelo seu baixo grau de escolaridade, bem como pelo estigma social carregado pela doença
da qual é portadora. Tanto é assim que, em consulta ao sistema CNIS/DATAPREV, verifica-se
que a autora jamais possuiu qualquer registro de trabalho, o que corrobora a tese de que esta
possui enorme dificuldade em se integrar ao mercado formal de trabalho. Assim, preenchido o
requisito da deficiência
4 - Há elementos para se afirmar que se trata de família que vive em estado de extrema
miserabilidade. Os recursos obtidos pela família do requerente são insuficientes para cobrir os
gastos ordinários, bem como os tratamentos médicos e cuidados especiais que lhe são
imprescindíveis. Tecidas essas considerações, restou demonstrada, quantum satis, no caso em
comento, situação de miserabilidade, prevista no art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993, a ensejar a
concessão do benefício assistencial.
5 - Agravo improvido." (EI 1458155, rel. Des. Fed. Toru Yamamoto, v. u., e-DJF3 08.09.2015) (g.
n.)
Além disso, a eminente Desembargadora Federal Marisa Santos destacou:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. REQUISITOS PREENCHIDOS.
PORTADORA DE AIDS ASSINTOMÁTICA. NÃO VINCULAÇÃO DO JUIZ AO LAUDO PERICIAL.
INCAPACIDADE LABORATIVA TIDA COMO TOTAL, PERMANENTE E INSUSCETÍVEL DE
REABILITAÇÃO. ART. 151 DA LEI 8.213/91: DESNECESSIDADE DE CUMPRIMENTO DE
CARÊNCIA. AFASTAMENTO DO TRABALHO EM RAZÃO DE DOENÇA INCAPACITANTE.
PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADA NÃO CONFIGURADA. VALOR DA RENDA MENSAL.
TERMO INICIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS E PERICIAIS. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA.
I - Para a aquisição do direito ao benefício de aposentadoria por invalidez, é necessária a
comprovação do preenchimento simultâneo de requisitos essenciais: a incapacidade laborativa
total, permanente e insuscetível de reabilitação, a qualidade de segurado e sua manutenção à
época do requerimento, carência de doze contribuições mensais, demonstração de que o
segurado não era portador da alegada doença ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social.
II - O laudo pericial atestou que, embora a apelante fosse comprovadamente portadora da
Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS), estava em tratamento médico e não apresentava
sintomas, concluindo que não havia incapacidade laborativa.
III - O juiz não está adstrito às conclusões do laudo pericial para a formação de sua convicção,
devendo analisar os aspectos sociais e subjetivos do autor para decidir se possui ou não
condições de retornar ao mercado de trabalho, para o exercício de atividade que lhe garanta a
subsistência. No caso de portadores de AIDS, as limitações são ainda maiores, mormente para
pessoas sem qualificações, moradoras de cidade do interior e portadora de doença incurável e
contagiosa, fatalmente submetidas à discriminação da sociedade. Ademais, devem preservar-se
do contato com agentes que possam desencadear as doenças oportunistas, devendo a
incapacidade ser tida como total, permanente e insuscetível de reabilitação para o exercício de
qualquer atividade.
IV - Cumprimento do período de carência e condição de segurada da Previdência Social
devidamente demonstrados. Não há como detectar a data exata do início da contaminação ou da
incapacidade do portador de AIDS, por tratar-se de moléstia cujo período de incubação é variável
de meses a anos. O art. 151 da lei de benefícios dispensa o cumprimento do período de carência
ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social for acometido dessa
doença. Ainda que a apelante tenha ingressado com a ação cinco anos após a última
contribuição, não há que se falar que decorreu o prazo hábil a caracterizar a quebra de vínculo
com a Previdência Social e a consequente perda da qualidade de segurada, nos termos do artigo
15 da lei de benefícios, conjugada à interpretação jurisprudencial dominante, pois comprovado
que deixou de obter colocação e de contribuir para com a Previdência em virtude de doença
incapacitante.
V - Sentença reformada, para condenar o INSS a pagar à apelante o benefício previdenciário de
aposentadoria por invalidez.
VI - A renda mensal inicial deverá ser calculada segundo o art. 44 da Lei 8213/91, com a redação
dada pela Lei nº 9.032/95, c/c os arts. 28, 29 e 33 da Lei nº 8.213/91 em regular liquidação de
sentença, em valor nunca inferior a um salário-mínimo (art. 201, parágrafo 2º, da Constituição
Federal).
VII - Inexistindo prévio requerimento administrativo onde demonstrada a incapacidade laborativa,
o termo inicial é fixado a partir da data do laudo pericial, quando reconhecida, no feito, a presença
dos males que impossibilitam o exercício de atividade vinculada à Previdência Social.
Precedentes.
VIII - As prestações em atraso deverão ser corrigidas monetariamente a partir de cada
vencimento, segundo as disposições da Lei nº 6.899/81, legislação superveniente, Súmulas nº 08
desta Corte e nº 148 do STJ.
IX - Incidirão os juros de mora a partir do laudo, à base de 6% ao ano até a vigência do novo
Código Civil e, após, à razão de 1% ao mês.
X - Honorários advocatícios de dez por cento sobre o montante da condenação, devendo incidir
sobre as parcelas devidas até o Acórdão. Inteligência do art. 20, § 3º do CPC, da jurisprudência
desta Turma e do STJ- Súmula 111.
XI - Honorários periciais fixados em R$ 200,00, de acordo com a Tabela II da Resolução
281/2002, do Conselho da Justiça Federal.
XII - Diante da gravidade da doença e do fato da apelante aguardar a prestação jurisdicional há 9
anos, configurados o relevante fundamento e o justificado receio de ineficácia do provimento final,
a justificar a concessão liminar da tutela, na forma do artigo 461, § 3º, CPC.
XIII - Apelação provida, com a concessão da antecipação da tutela jurisdicional, determinando
que o INSS proceda à imediata implantação da prestação em causa, intimando-se a autoridade
administrativa a fim de que cumpra a ordem judicial no prazo de trinta dias, sob pena de multa
diária, que será oportunamente fixada em caso de descumprimento.
(TRF 3a. Região - Apelação Cível - 517864 - Órgão Julgador: Nona Turma, Data: 10/05/2004 -
Rel. JUÍZA MARISA SANTOS).
Assim, considerando tratar-se de incapacidade total e permanente, sem possibilidade de
reabilitação, afigura-se correta a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez,
conforme r. sentença.
Elucidando esse entendimento, trago à colação o seguinte precedente:
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO LEGAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. REQUISITOS
PREENCHIDOS. DESCONTO JÁ DETERMINADO.
- Agravo do INSS insurgindo-se contra a decisão monocrática que deu parcial provimento ao
recurso da autarquia, para autorizar o desconto das prestações correspondentes aos meses em
que a parte autora recolheu contribuições à Previdência Social, após o termo inicial. - Sustenta a
autarquia, em síntese, que a parte autora não comprovou a incapacidade, sendo que, inclusive,
manteve vínculo empregatício, de 14/08/2014 a 01/2015. Requer, subsidiariamente, sejam
descontados os valores referentes ao período em que o autor trabalhou. - Cuida-se de pedido de
concessão de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez, com tutela antecipada. - Extrato
do CNIS informa diversos vínculos empregatícios em nome do autor, sendo o último a partir de
14/08/2014, com última remuneração em 01/2015. Consta, ainda, a concessão de auxílio-doença,
de 23/01/2014 a 23/10/2014 (fls. 96/97). - A parte autora, mecânico, contando atualmente com 59
anos de idade, submeteu-se à perícia médica judicial. - O laudo atesta que a parte autora
apresenta hepatite viral crônica C, episódios depressivos e asma não especificada. Conclui pela
existência de incapacidade total e permanente ao labor, desde 23/06/2014.- Verifica-se dos
documentos apresentados que a parte autora esteve vinculada ao Regime Geral de Previdência
Social por mais de 12 (doze) meses, além do que mantinha vínculo empregatício quando ajuizou
a demanda em 30/10/2014, mantendo, pois, a qualidade de segurado, nos termos do art. 15, da
Lei nº 8.213/91.- Quanto à incapacidade, o laudo judicial é claro ao descrever as patologias das
quais a parte autora é portadora, concluindo pela incapacidade total e definitiva para o labor.-
Observe-se que, embora a Autarquia Federal aponte que o requerente não esteja incapacitado
para o trabalho, tendo em vista o seu vínculo empregatício até 01/2015, não se pode concluir
deste modo, eis que o autor não possui nenhuma outra fonte de renda para manter a sua
sobrevivência, ficando, deste modo, compelido a laborar, ainda que não esteja em boas
condições de saúde.- Considerando, pois, que a parte autora manteve a qualidade de segurado
até a data da propositura da ação e é portadora de doença que a incapacita de modo total e
permanente para qualquer atividade laborativa, faz jus ao benefício de aposentadoria por
invalidez.- Com relação ao período em que a parte autora trabalhou, a decisão monocrática é
expressa ao determinar o desconto das prestações correspondentes aos meses em que houve
recolhimento à Previdência Social, não se justificando o recurso quanto a este aspecto.- A
decisão monocrática com fundamento no art. 557, caput e § 1º-A, do CPC, que confere poderes
ao relator para decidir recurso manifestamente improcedente, prejudicado, deserto, intempestivo
ou contrário a jurisprudência dominante do respectivo Tribunal, do Supremo Tribunal Federal ou
de Tribunal Superior, sem submetê-lo ao órgão colegiado, não importa em infringência ao CPC ou
aos princípios do direito.- É assente a orientação pretoriana no sentido de que o órgão colegiado
não deve modificar a decisão do Relator, salvo na hipótese em que a decisão impugnada não
estiver devidamente fundamentada, ou padecer dos vícios da ilegalidade e abuso de poder, e for
passível de resultar lesão irreparável ou de difícil reparação à parte.- Agravo improvido.(TRF 3ª
Região, OITAVA TURMA, APELREEX 0036346-76.2015.4.03.9999, Rel. DESEMBARGADORA
FEDERAL TANIA MARANGONI, julgado em 01/02/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:12/02/2016).
Por fim, no caso em espécie, acrescento que o autor permaneceu fora do mercado de trabalho,
em gozo de auxílio-doença, desde 2001 até 2018, quando cessado esse benefício, situação a
confirmar não haver dúvida de que enfrentaria significativas dificuldades para se reinserir no
mercado de trabalho, haja vista o longo período que ficou sem laborar, exatamente em razão da
doença em questão.
Ante todo o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação do INSS.
É o voto.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5004874-31.2018.4.03.6130
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: ODAIR NESTEFANI
Advogado do(a) APELADO: ANDERSON FERREIRA DE MELO SILVA - SP378408-A
OUTROS PARTICIPANTES:
-V O T O
Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame
da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.
DA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E DO AUXÍLIO-DOENÇA
Os requisitos da aposentadoria por invalidez encontram-se preceituados nos arts. 42 e seguintes
da Lei n.° 8.213/91, consistindo, mais precisamente, na presença da qualidade de segurado, na
existência de incapacidade total e permanente para o trabalho e na ocorrência do cumprimento
da carência, quando exigida.
O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos art. 59 e seguintes do
mesmo diploma legal, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária.
Excepcionalmente, com base em entendimento jurisprudencial consolidado, admite-se a
concessão de tais benefícios mediante comprovação pericial de incapacidade parcial e definitiva
para o desempenho da atividade laborativa, que seja incompatível com a ocupação habitual do
requerente e que implique em limitações tais que restrinjam sobremaneira a possibilidade de
recolocação no mercado de trabalho, diante das profissões que exerceu durante sua vida
profissional (STJ: AgRg no AREsp 36.281/MS, rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, 6.ª Turma,
DJe de 01/03/2013; e AgRg no AREsp 136474/MG, rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA
FILHO, 1.ª Turma, DJe de 29/06/2012).
Imprescindível, ainda, o preenchimento do requisito da qualidade de segurado, nos termos dos
arts. 11 e 15, ambos da Lei de Benefícios.
"Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer
atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem
remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de
segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para
prestar serviço militar;
VI - até (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver
pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da
qualidade de segurado.
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado
desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério
do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a
Previdência Social.
§ 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no
Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês
imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos."
A perda da qualidade de segurado, portanto, ocorrerá no 16.º dia do segundo mês seguinte ao
término do prazo fixado no art. 30, II, da Lei n.º 8.212/91, salvo na hipótese do § 1.º do art. 102 da
Lei n.º 8.213/91 – qual seja, em que comprovado que a impossibilidade econômica de continuar a
contribuir decorreu da incapacidade laborativa.
Registre-se que, perdida a qualidade de segurado, imprescindível o recolhimento de, pelo menos,
seis meses, para que seja considerado novamente filiado ao regime, nos exatos termos do art.
27-A da Lei de Benefícios.
Por fim, necessário o cumprimento do período de carência, nos termos do art. 25 dessa mesma
lei, a saber:
“Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social
depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no artigo 26:
I – auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 (doze) contribuições mensais;”
Em casos específicos, em que demonstrada a necessidade de assistência permanente de outra
pessoa, possível, ainda, com base no art. 45 da Lei de Benefícios, o acréscimo de 25% ao valor
da aposentadoria por invalidez porventura concedida.
DO CASO DOS AUTOS (AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE LABORATIVA)
A principal condição para deferimento do benefício não se encontra presente, eis que não
comprovada a incapacidade para o trabalho.
Do que consta do laudo pericial anexado aos autos, a parte autora não está incapacitada para o
exercício de suas atividades laborativas, muito embora seja portadora de HIV diagnosticado em
1997, além de ter outras doenças.
Explicou o perito que:
“Trata-se de periciando com 50 anos de idade, que não apresentou a Carteira de Trabalho e
Previdência Social. Relatou ter trabalhado com registro de contrato de trabalho como vendedor de
comércio (loja e locação de roupas), monitor de desenvolvimento profissional (ensino da profissão
de cabelereiro) no SENAC. Informa que foi afastado do trabalho em 07/02/2001. Teve benefício
previdenciário (Auxílio Doença), concedidos de o período 29/03/2001 a 26/05/2006 e de
26/06/2006 a 06/10/2006. Em 07/10/2006 o Auxílio Doença foi transformado em Aposentadoria
por Invalidez. Em 11/07/2018, em revisão administrativa, teve o benefício cessado depois de
reavaliação médica e receberá mensalidades de recuperação até 11/01/2020. Foi caracterizado
apresentar a síndrome de deficiência imunológica adquirida desde 1997 (22 anos de evolução),
época que apresentou meningite (neurocriptococose e monilíase esofágica). No curso do tempo
consta tratamento de tuberculose renal e ocorrência de refluxo vesico-ureteral, que predispõem a
ocorrência de episódios de infecções urinárias, com tratamento apenas dos episódios e
profiláticos, não constando proposta de tratamento do refluxo. Também relatou doença do refluxo
gastro-esofágico, com tratamento clínico. A avaliação pericial revelou estar em bom estado geral,
sem manifestações de repercussão por descompensação das doenças. Sem manifestações de
repercussão nutricional (do estado geral).”(Id. 150939184)
E, ainda:
“Do visto, os dados apresentados revelam evolução com intercorrências renais (infecções
urinárias de repetição secundária a refluxo vesico-ureteral), mas sem que tivesse demandado
internações ou caracterização de episódios de maior gravidade em termos de repercussão.
O tratamento que informou se submeter não foca complicações ou condição clínica adversa,
associado que a condição imunológica é de risco moderado de desenvolvimento de sintomas
constitucionais e de doenças oportunistas, cuja situação se mantém relativamente estável desde
2009.
Desta forma, o estado atual de saúde do periciando, apurado por exame clínico que respeita o
rigor técnico da propedêutica médico-pericial, complementado pela análise dos documentos
médicos apresentados, não são indicativos de restrições para o desempenho dos afazeres
habituais, inclusive trabalho.” (Id. 150939184)
Conforme jurisprudência desta Corte quando do julgamento de caso semelhante, em que o
segurado também era portador de HIV, “o estigma social não é bastante à caracterização da
deficiência, à medida que a autora não se encontra incapacitada, nem abandonada pelo Estado
porquanto faz jus a medicação adequada do SUS” (Apelação Cível 5082590-36.2019.4.03.9999,
Rel. Juiz Federal Convocado RODRIGO ZACHARIAS, julgado em 23/05/2019, e - DJF3 Judicial 1
DATA: 28/05/2019). Conclusão contrária redundaria na concessão do benefício a quaisquer
portadores de HIV, o que não se afigura razoável.
Nem cabe argumentar que o juiz não se encontra vinculado ao laudo pericial, eis que não foram
trazidos aos autos elementos hábeis a abalar as conclusões nele contidas.
Nesse contexto, “a mera irresignação do segurado com a conclusão do perito ou a alegação de
que o laudo é contraditório ou omisso, sem o apontamento de nenhuma divergência técnica
justificável, não constituem motivos aceitáveis para a realização de nova perícia, apresentação de
quesitos complementares ou realização de diligências” (9.ª Turma, Apelação Cível 5897223-
19.2019.4.03.9999, rel. Desembargadora Federal Daldice Santana, e - DJF3 Judicial 1 de
03/03/2020).
Forçoso, portanto, o reconhecimento da improcedência do pedido.
Condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, arbitrados em
10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, suspensa, porém, a exigibilidade, na
forma do art. 98, § 3.º, do CPC, por se tratar de beneficiária da gratuidade da justiça.
Posto isso, dou provimento à apelação, para reformar a sentença e julgar improcedente o pedido
formulado, revogando a tutela anteriormente concedida.
É o voto.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-
DOENÇA. INCAPACIDADE LABORATIVA. CONSTATAÇÃO. HIV. REQUISITOS
PREENCHIDOS. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ DEVIDA.
- Apesar da perícia judicial não ter constatado a incapacidade laborativa, o benefício de
aposentadoria por invalidez deve ser concedido.
- O portador de HIV, mesmo assintomático, necessita de cuidados extremos, quando submetido
ao controle medicamentoso que, por si só, causa deletérias reações adversas. E, ainda, sofre
severas consequências socioeconômicas oriundas de sua condição. Não raro lhe é negado
emprego formal, diante do preconceito que a doença carrega, dificultando a sua subsistência.
- Considerando tratar-se de incapacidade total e permanente, sem possibilidade de reabilitação,
afigura-se correta a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, conforme r. sentença.
- No caso em espécie, o autor permaneceu fora do mercado de trabalho, em gozo de auxílio-
doença, desde 2001 até 2018, quando cessado esse benefício, situação a confirmar não haver
dúvida de que enfrentaria significativas dificuldades para se reinserir no mercado de trabalho,
haja vista o longo período que ficou sem laborar, exatamente em razão da doença em questão.
- Apelação do INSS não provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, prosseguindo no
julgamento, a Oitava Turma, por maioria, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do
voto do Desembargador Federal Luiz Stefanini, com quem votaram os Desembargadores
Federais David Dantas, Newton De Lucca e Batista Gonçalves, vencida a Relatora, que lhe dava
provimento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
