Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
0001799-04.2015.4.03.6121
Relator(a)
Desembargador Federal NEWTON DE LUCCA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
27/04/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 30/04/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO. APOSENTADORIA ESPECIAL.
I- No que se refere à conversão do tempo de serviço especial em comum, a jurisprudência é
pacífica no sentido de que deve ser aplicada a lei vigente à época em que exercido o trabalho, à
luz do princípio tempus regit actum.
II- Em se tratando do agente nocivo ruído, a atividade deve ser considerada especial se exposta a
ruídos acima de 80 dB, nos termos do Decreto nº 53.831/64. No entanto, após 5/3/97, o limite foi
elevado para 90 dB, conforme Decreto nº 2.172. A partir de 19/11/03 o referido limite foi reduzido
para 85 dB, nos termos do Decreto nº 4.882/03.
III- A documentação apresentada permite o reconhecimento da atividade especial em parte do
período pleiteado.
IV- Com relação à aposentadoria especial, não houve o cumprimento dos requisitos previstos no
art. 57 da Lei nº 8.213/91.
V- Apelação do INSS improvida. Apelação da parte autora improvida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0001799-04.2015.4.03.6121
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELANTE: NELSON BONARIO SOARES FILHO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: AMILCARE SOLDI NETO - SP347955-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, NELSON BONARIO SOARES
FILHO
Advogado do(a) APELADO: AMILCARE SOLDI NETO - SP347955-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0001799-04.2015.4.03.6121
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: NELSON BONARIO SOARES FILHO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: AMILCARE SOLDI NETO - SP347955-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, NELSON BONARIO SOARES
FILHO
Advogado do(a) APELADO: AMILCARE SOLDI NETO - SP347955-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Trata-se de
ação ajuizada em 18/6/15 em face do INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, visando à
concessão da aposentadoria especial desde a data do requerimento administrativo, mediante o
reconhecimento do caráter especial das atividades mencionadas na petição inicial.
Foram deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita.
O Juízo a quo julgou parcialmente procedente o pedido, para reconhecer o caráter especial das
atividades exercidas no período de 19/11/03 a 2/11/14.
Foram opostos embargos de deformada, apelou a autarquia, sustentando a improcedência do
pedido.
Inconformada, apelou a autarquia, sustentando a improcedência do pedido.
O Juízo a quo acolheu os embargos de declaração para retificar o dispositivo, a fim de condenar
o demandante ao pagamento de honorários advocatícios de R$ 4.000,00 em favor do INSS,
ficando suspensa a exigibilidade em razão da gratuidade concedida, devendo a autarquia pagar
ao demandante honorários de R$4.000, nos termos do art. 85, §§ 2º e 8º do CPC/15.
A parte autora também apelou, pleiteando o enquadramento, como especial, das atividades
exercidas no período de 6/3/97 a 18/11/03, bem como a concessão da aposentadoria especial.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
É o breve relatório.
Newton De Lucca
Desembargador Federal Relator
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0001799-04.2015.4.03.6121
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: NELSON BONARIO SOARES FILHO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: AMILCARE SOLDI NETO - SP347955-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, NELSON BONARIO SOARES
FILHO
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OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): No que se refere
ao reconhecimento da atividadeespecial, a jurisprudência é pacífica no sentido de que deve ser
aplicada a lei vigente à época em que exercido o trabalho, à luz do princípio tempus regit actum
(Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.310.034-PR).
Quanto aos meios de comprovação do exercício da atividade em condições especiais, até
28/4/95, bastava a constatação de que o segurado exercia uma das atividades constantes dos
anexos dos Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79. O rol dos referidos anexos é considerado
meramente exemplificativo (Súmula nº 198 do extinto TFR).
Com a edição da Lei nº 9.032/95, a partir de 29/4/95 passou-se a exigir por meio de formulário
específico a comprovação da efetiva exposição ao agente nocivo perante o Instituto Nacional do
Seguro Social.
A Medida Provisória nº 1.523 de 11/10/96, a qual foi convertida na Lei nº 9.528 de 10/12/97, ao
incluir o § 1º ao art. 58 da Lei nº 8.213/91, dispôs sobre a necessidade da comprovação da
efetiva sujeição do segurado a agentes nocivos à saúde do segurado por meio de laudo técnico,
motivo pelo qual considerava necessária a apresentação de tal documento a partir de 11/10/96.
No entanto, a fim de não dificultar ainda mais o oferecimento da prestação jurisdicional, passei a
adotar o posicionamento no sentido de exigir a apresentação de laudo técnico somente a partir
6/3/97, data da publicação do Decreto nº 2.172, de 5/3/97, que aprovou o Regulamento dos
Benefícios da Previdência Social. Nesse sentido, quadra mencionar os precedentes do C.
Superior Tribunal de Justiça: Incidente de Uniformização de Jurisprudência, Petição nº 9.194/PR,
Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, 1ª Seção, j. em 28/5/14, v.u., DJe 2/6/14; AgRg no
AREsp. nº 228.590, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, 1ª Turma, j. em 18/3/14, v.u.,
DJe 1º/4/14; bem como o acórdão proferido pela Turma Nacional de Uniformização dos Juizados
Especiais Federais no julgamento do Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei Federal nº
0024288-60.2004.4.03.6302, Relator para Acórdão Juiz Federal Gláucio Ferreira Maciel
Gonçalves, j. 14/2/14, DOU 14/2/14.
Por fim, observo que o art. 58 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Medida Provisória nº
1.523 de 11/10/96, a qual foi convertida na Lei nº 9.528 de 10/12/97, em seu § 4º, instituiu o Perfil
Profissiográfico Previdenciário (PPP), sendo que, com a edição do Decreto nº 4.032/01, o qual
alterou a redação dos §§ 2º e 6º e inseriu o § 8º ao art. 68 do Decreto nº 3048/99, passou-se a
admitir o referido PPP para a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes
nocivos. O art. 68 do Decreto nº 8.123/13 também traz considerações sobre o referido PPP.
Devo salientar que o laudo (ou PPP) não contemporâneo ao exercício das atividades não impede
a comprovação de sua natureza especial, desde que não tenha havido alteração expressiva no
ambiente de trabalho.
Ademais, se em data posterior ao trabalho realizado foi constatada a presença de agentes
nocivos, é de bom senso imaginar que a sujeição dos trabalhadores à insalubridade não era
menor à época do labor, haja vista os avanços tecnológicos e a evolução da segurança do
trabalho que certamente sobrevieram com o passar do tempo.
Quadra ressaltar, por oportuno, que o PPP é o formulário padronizado, redigido e fornecido pela
própria autarquia, sendo que no referido documento não consta campo específico indagando
sobre a habitualidade e permanência da exposição do trabalhador ao agente nocivo,
diferentemente do que ocorria nos anteriores formulários SB-40, DIRBEN 8030 ou DSS 8030, nos
quais tal questionamento encontrava-se de forma expressa e com campo próprio para aposição
da informação. Dessa forma, não me parece razoável que a deficiência contida no PPP possa
prejudicar o segurado e deixar de reconhecer a especialidade da atividade à míngua de
informação expressa com relação à habitualidade e permanência.
Vale ressaltar que o uso de equipamentos de proteção individual - EPInão é suficiente para
descaracterizar a especialidadeda atividade, a não ser que comprovada a real efetividade do
aparelho na neutralização do agente nocivo, sendo que, em se tratando, especificamente, do
agente ruído, não há, no momento, equipamento capaz de neutralizar a nocividade gerada pelo
referido agente agressivo, conforme o julgamento realizado, em sessão de 4/12/14, pelo Plenário
do C. Supremo Tribunal Federal, na Repercussão Geral reconhecida no Recurso Extraordinário
com Agravo nº 664.335/SC, de Relatoria do E. Ministro Luiz Fux.
Observo, ainda, que a informação registrada pelo empregador no Perfil Profissiográfico
Previdenciário (PPP) sobre a eficácia do EPI não tem o condão de descaracterizar a sujeição do
segurado aos agentes nocivos. Conforme tratado na decisão proferida pelo C. STF na
Repercussão Geral acima mencionada, a legislação previdenciária criou, com relação à
aposentadoria especial, uma sistemática na qual é colocado a cargo do empregador o dever de
elaborar laudo técnico voltado a determinar os fatores de risco existentes no ambiente de
trabalho, ficando o Ministério da Previdência Social responsável por fiscalizar a regularidade do
referido laudo. Ao mesmo tempo, autoriza-se que o empregador obtenha benefício tributário caso
apresente simples declaração no sentido de que existiu o fornecimento de EPI eficaz ao
empregado.
Notório que o sistema criado pela legislação é falho e incapaz de promover a real comprovação
de que o empregado esteve, de fato, absolutamente protegido contra o fator de risco. A respeito,
é precisa a observação do E. Ministro Luís Roberto Barroso, ao sustentar que "considerar que a
declaração, por parte do empregador, acerca do fornecimento de EPI eficaz consiste em condição
suficiente para afastar a aposentadoria especial, e, como será desenvolvido adiante, para obter
relevante isenção tributária, cria incentivos econômicos contrários ao cumprimento dessas
normas" (Normas Regulamentadoras relacionadas à Segurança do Trabalho).
Exata, ainda, a manifestação do E. Ministro Marco Aurélio, ao invocar o princípio da primazia da
realidade, segundo o qual uma verdade formal não pode se sobrepor aos fatos que realmente
ocorrem - sobretudo em hipótese na qual a declaração formal é prestada com objetivos
econômicos.
Logo, se a legislação previdenciária cria situação que resulta, na prática, na inexistência de dados
confiáveis sobre a eficácia ou não do EPI, não se pode impor ao segurado - que não concorre
para a elaboração do laudo, nem para sua fiscalização - o dever de fazer prova da ineficácia do
equipamento de proteção que lhe foi fornecido. Caberá, portanto, ao INSS o ônus de provar que o
trabalhador foi totalmente protegido contra a situação de risco, pois não se pode impor ao
empregado - que labora em condições nocivas à sua saúde - a obrigação de suportar
individualmente os riscos inerentes à atividade produtiva perigosa, cujos benefícios são
compartilhados por toda a sociedade.
Ressalto, adicionalmente, que a Corte Suprema, ao apreciar a Repercussão Geral acima
mencionada, afastou a alegação, suscitada pelo INSS, de ausência de prévia fonte de custeio
para o direito à aposentadoria especial. O E. Relator, em seu voto, deixou bem explicitada a regra
que se deve adotar ao afirmar: "Destarte, não há ofensa ao princípio da preservação do equilíbrio
financeiro e atuarial, pois existe a previsão na própria sistemática da aposentadoria especial da
figura do incentivo (art. 22, II e § 3º, Lei n.º 8.212/91), que, por si só, não consubstancia a
concessão do benefício sem a correspondente fonte de custeio (art. 195, § 5º, CRFB/88).
Corroborando o supra esposado, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal considera que o
art. 195, § 5º, da CRFB/88, contém norma dirigida ao legislador ordinário, disposição inexigível
quando se tratar de benefício criado diretamente pela própria constituição".
Quanto à aposentadoria especial, em atenção ao princípio tempus regit actum, o benefício deve
ser disciplinado pela lei vigente à época em que implementados os requisitos para a sua
concessão, devendo ser observadas as disposições do art. 57 da Lei nº 8.213/91.
Cumpre ressaltar que, no cálculo do salário de benefício da aposentadoria especial, não há a
incidência do fator previdenciário, tendo em vista o disposto no inc. II do art. 29 da Lei nº
8.213/91.
Passo à análise do caso concreto.
1) Períodos:6/3/97 a 18/11/03 e de 19/11/03 a 2/11/14.
Empresa: Volkswagen do Brasil – Indústria de Veículos Automotores Ltda.
Atividades/funções: ponteador.
Agente(s) nocivo(s): ruído de 88 dB (de 6/3/97 a 18/11/03), ruído de 91,8 dB (14/4/08 a 30/9/08),
e 88 dB (1/10/08 a 1/10/12) e ruído de 89,3 dB (2/10/12 a 28/11/14).
Enquadramento legal: Código 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64 (acima de 80 decibéis), Decreto nº
2.172/97 (acima de 90 decibéis) e Decreto nº 4.882/03 (acima de 85 decibéis).
Provas: Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP (ID: 146572354 - Pag. 33), datado de
28/11/14.
Conclusão: Ficou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial no
período de 19/11/03 a 2/11/14, em decorrência da exposição, de forma habitual e permanente, ao
agente ruído acima do limite de tolerância. No entanto, não ficou comprovada a especialidade do
labor no período de 19/11/03 a 2/11/14, tendo em vista que a exposição ao ruído foi inferior ao
limite de tolerância.
No tocante à comprovação da exposição ao agente nocivo ruído, há a exigência de apresentação
de laudo técnico ou PPP para comprovar a efetiva exposição a ruídos acima de 80 dB, nos
termos do Decreto nº 53.831/64. Após 5/3/97, o limite foi elevado para 90 dB, conforme Decreto
nº 2.172/97. A partir de 19/11/03 o referido limite foi reduzido para 85 dB, nos termos do Decreto
nº 4.882/03. Quadra mencionar, ainda, que o C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do
Recurso EspecialRepetitivo Representativo de Controvérsia nº 1.398.260/PR (2013/0268413-2),
firmou posicionamento no sentido da impossibilidade de aplicação retroativa do Decreto nº
4.882/03, uma vez que deve ser aplicada a lei em vigor no momento da prestação do serviço.
Quanto à alegação de não ser possível aferir se a metodologia utilizada pelo empregador para a
avaliação do agente ruído estaria de acordo com a NR-15 ou NHO-01, verifico que o PPP juntado
aos autos encontra-se devidamente preenchido e assinado, contendo a técnica utilizada e a
quantidade de decibéis a que o segurado esteve exposto, bem como o nome do profissional
responsável pelos registros ambientais e assinatura do representante legal da empresa. Assim,
não verifico nenhuma contradição entre a metodologia adotada pelo emitente do PPP e os
critérios aceitos pela legislação regulamentadora que pudesse aluir a confiabilidade do método
empregado pela empresa para a aferição dos fatores de risco existentes no ambiente de trabalho.
Devido recordar, ainda, que a responsabilidade pelo preenchimento do PPP é imposta ao
empregador, não podendo o empregado ser penalizado por eventuais imperfeições quanto à
colheita de informações técnicas pela empresa, desde que inexista falha grave capaz de
comprometer a idoneidade dos dados técnicos informados pelo tomador dos serviços.
Dessa forma, somando-se o período especial reconhecido nos presentes autos, com os períodos
já declarados como especiais administrativamente pelo INSS, não perfaz o autor 25 anos de
atividade especial, motivo pelo qual não faz jus à concessão da aposentadoria especial.
Ante o exposto, nego provimento à apelação da parte autora e nego provimento à apelação do
INSS.
É o meu voto.
Newton De Lucca
Desembargador Federal Relator
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO. APOSENTADORIA ESPECIAL.
I- No que se refere à conversão do tempo de serviço especial em comum, a jurisprudência é
pacífica no sentido de que deve ser aplicada a lei vigente à época em que exercido o trabalho, à
luz do princípio tempus regit actum.
II- Em se tratando do agente nocivo ruído, a atividade deve ser considerada especial se exposta a
ruídos acima de 80 dB, nos termos do Decreto nº 53.831/64. No entanto, após 5/3/97, o limite foi
elevado para 90 dB, conforme Decreto nº 2.172. A partir de 19/11/03 o referido limite foi reduzido
para 85 dB, nos termos do Decreto nº 4.882/03.
III- A documentação apresentada permite o reconhecimento da atividade especial em parte do
período pleiteado.
IV- Com relação à aposentadoria especial, não houve o cumprimento dos requisitos previstos no
art. 57 da Lei nº 8.213/91.
V- Apelação do INSS improvida. Apelação da parte autora improvida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação do INSS e negar provimento à apelação da
parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
