O Juiz Federal Convocado Bruno Cezar da Cunha Teixeira (Relator):
Preliminarmente, rejeito o pedido de efeito suspensivo à apelação formulado pelo INSS. Esse somente poderia ser deferido na hipótese do artigo 995, parágrafo único do CPC, o que não foi demonstrado pela autarquia apelante, principalmente em relação ao perigo de dano grave ou de difícil reparação.
Quanto à pensão por morte, estabelece a Lei 8.213/1991 na data do óbito:
"Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:
I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave; (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
[...]
§ 4º A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada
§ 5º As provas de união estável e de dependência econômica exigem início de prova material contemporânea dos fatos, produzido em período não superior a 24 (vinte e quatro) meses anterior à data do óbito ou do recolhimento à prisão do segurado, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no regulamento. (Incluído pela Lei nº 13.846, de 2019)
[...]
Art. 26. Independe de carência a concessão das seguintes prestações:
I - do óbito, quando requerida em até 180 (cento e oitenta) dias após o óbito, para os filhos menores de 16 (dezesseis) anos, ou em até 90 (noventa) dias após o óbito, para os demais dependentes; (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)
II - do requerimento, quando requerida após o prazo previsto no inciso anterior; (Incluído pela Lei nº 9.528, de 1997)
[...]
Art. 77. A pensão por morte, havendo mais de um pensionista, será rateada entre todos em parte iguais. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)
§ 1º Reverterá em favor dos demais a parte daquele cujo direito à pensão cessar. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)
§ 2º O direito à percepção da cota individual cessará: (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)
I - pela morte do pensionista; (Incluído pela Lei nº 9.032, de 1995)
II - para o filho, a pessoa a ele equiparada ou o irmão, de ambos os sexos, ao completar vinte e um anos de idade, salvo se for inválido ou tiver deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave; (Redação dada pela Lei nº 13.183, de 2015) (Vigência)
III - para filho ou irmão inválido, pela cessação da invalidez; (Redação dada pela Lei nº 13.135, de 2015)
IV - para filho ou irmão que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave, pelo afastamento da deficiência, nos termos do regulamento; (Redação dada pela Lei nº 13.135, de 2015) (Vigência)
V - para cônjuge ou companheiro: (Incluído pela Lei nº 13.135, de 2015)
a) se inválido ou com deficiência, pela cessação da invalidez ou pelo afastamento da deficiência, respeitados os períodos mínimos decorrentes da aplicação das alíneas "b" e "c"; (Incluído pela Lei nº 13.135, de 2015)
b) em 4 (quatro) meses, se o óbito ocorrer sem que o segurado tenha vertido 18 (dezoito) contribuições mensais ou se o casamento ou a união estável tiverem sido iniciados em menos de 2 (dois) anos antes do óbito do segurado; (Incluído pela Lei nº 13.135, de 2015)
c) transcorridos os seguintes períodos, estabelecidos de acordo com a idade do beneficiário na data de óbito do segurado, se o óbito ocorrer depois de vertidas 18 (dezoito) contribuições mensais e pelo menos 2 (dois) anos após o início do casamento ou da união estável: (Incluído pela Lei nº 13.135, de 2015)
1) 3 (três) anos, com menos de 21 (vinte e um) anos de idade; (Incluído pela Lei nº 13.135, de 2015)
2) 6 (seis) anos, entre 21 (vinte e um) e 26 (vinte e seis) anos de idade; (Incluído pela Lei nº 13.135, de 2015)
3) 10 (dez) anos, entre 27 (vinte e sete) e 29 (vinte e nove) anos de idade; (Incluído pela Lei nº 13.135, de 2015)
4) 15 (quinze) anos, entre 30 (trinta) e 40 (quarenta) anos de idade; (Incluído pela Lei nº 13.135, de 2015)
5) 20 (vinte) anos, entre 41 (quarenta e um) e 43 (quarenta e três) anos de idade; (Incluído pela Lei nº 13.135, de 2015)
6) vitalícia, com 44 (quarenta e quatro) ou mais anos de idade. (Incluído pela Lei nº 13.135, de 2015)
VI - pela perda do direito, na forma do § 1º do art. 74 desta Lei. (Incluído pela Lei nº 13.846, de 2019)
§ 2o-A. Serão aplicados, conforme o caso, a regra contida na alínea "a" ou os prazos previstos na alínea "c", ambas do inciso V do § 2o, se o óbito do segurado decorrer de acidente de qualquer natureza ou de doença profissional ou do trabalho, independentemente do recolhimento de 18 (dezoito) contribuições mensais ou da comprovação de 2 (dois) anos de casamento ou de união estável. (Incluído pela Lei nº 13.135, de 2015) [...] (g.n.)
A concessão exige três elementos: evento morte, qualidade de segurado do instituidor e vínculo de dependência dos beneficiários. Incide a legislação vigente no óbito (Súmula 340 STJ), sendo devido o benefício mesmo com perda da qualidade de segurado, desde que implementados os requisitos para aposentadoria até o falecimento (Súmula 416 STJ).
Além disso, o conceito de união estável encontra-se no artigo 16, § 6º, do Decreto 3.048/1999, com suas alterações: "Considera-se união estável aquela configurada na convivência pública, contínua e duradoura entre o homem e a mulher, estabelecida com intenção de constituição de família, observado o disposto no § 1º do artigo 1.723 da Lei n. 10.406, de 2002 - Código Civil, desde que comprovado o vínculo na forma estabelecida no § 3º do artigo 22. (Redação dada pelo Decreto 10.410, de 2020)".
Feitas essas considerações, observa-se que a questão controvertida versa sobre: (1) o reconhecimento da união estável; e (2) os termos acerca da implementação do benefício.
O óbito é incontroverso e ocorreu em 17/12/2021 (ID 281805863, f. 24). A qualidade de segurado do instituidor também restou demonstrada, conforme inscrições na carteira de trabalho no período anterior ao óbito (ID 281805863, f. 19-22).
A autora afirma que convivia em união estável com o segurado por mais de 20 (vinte) anos. Para provar o alegado, juntou os seguintes documentos:
a) Processo de Abertura de Inventário que indica a autora como viúva meeira e inventariante (ID 281805863, f. 38-39 / ID 281805865, f. 1-6)
b) Certidão de nascimento dos filhos (ID 281805863, f. 25-28)
c) Certidão do óbito (ID 281805863, f. 24)
d) Negativa do requerimento administrativo do benefício (ID 281805865, f. 7-9)
Foram ouvidas as testemunhas SAMANTA JIMENEZ (ID 281805872) e ROSÂNGELA BONFIM (ID 281805870) para melhor elucidação dos fatos. Através de seus depoimentos, coerentes com a prova documental, confirmaram que a requerente e o de cujus conviviam maritalmente à época do óbito.
Com efeito, o conjunto probatório dos autos, composto pelas alegações da autora, prova documental e depoimento das testemunhas, demonstra inequivocamente a convivência pública e notória, reconhecendo-se a existência da união estável duradoura entre a autora CAROLINA BALMACEDA NUNEZ e o falecido, inclusive com início de prova material contemporânea dos fatos à época do óbito, em atendimento aos requisitos do artigo 16, § 5º, da Lei 8.213/1991.
Comprovados todos os requisitos legais previstos nos artigos 74 e seguintes da Lei 8.213/1991, é devida a concessão do benefício da pensão por morte à autora.
O óbito do instituidor do benefício ocorreu em 24/04/2022, portanto, na vigência da Lei 13.135 de 17 de junho de 2015, devendo-se analisar os requisitos quanto à duração do benefício concedido para CAROLINA BALMACEDA NUNEZ. Tendo sido comprovada a união estável por período superior a 2 (dois) anos, e tendo a companheira 41 (quarenta e um) anos de idade na data do óbito, deve prosperar o pedido subsidiário da apelante para o pagamento do benefício por apenas 20 (vinte) anos, visto que a condição da autora apelada está enquadrada no artigo 77, V, alínea "c", item 5, da Lei 8.213/1991
Por fim, a alegação da necessidade de comprovação da cumulação de benefícios não merece acolhimento, pois a Portaria do INSS 450/2020 se aplica apenas ao procedimento na esfera administrativa, não vinculando a esfera judicial.
Acerca do termo inicial do benefício, a sentença, acertadamente, indicou que deve contar da data do óbito, uma vez que o pedido administrativo (19/01/2022 - ID 281805865, f. 7-9) foi realizado dentro do prazo legal previsto no artigo 74, I, da Lei 8.213/1991.
Rejeito a alegação de prescrição das diferenças pretendidas, por não ter transcorrido prazo superior a cinco anos (artigo 103, parágrafo único, da Lei 8.213/1991) entre o requerimento administrativo (19/01/2022 - ID 281805865, f. 7-9) e a propositura da presente demanda (01/07/2022 - ID 281805863, f. 1-9).
Quanto aos parâmetros e termo inicial da incidência da taxa de juros, nego provimento à apelação, visto que os critérios estabelecidos para o cálculo dos juros de mora e correção monetária estão adequados em conformidade com o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal no RE 870.947 (Tema 810 da Repercussão Geral), até a entrada em vigor da EC 113/2021, quando então passará a incidir, de forma exclusiva, a taxa Selic, conforme disposto no Manual de Cálculos da Justiça Federal e na Nota Técnica 02/2025 do CJF, emitida após a entrada em vigor da EC 136/2025.
Por fim, quanto ao estabelecimento de multa diária por atraso na implantação de benefício previdenciário, é possível a revisão do valor e do prazo da multa, de ofício e com fundamento nos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, nos termos do artigo 537, § 1º, do CPC. Nesse sentido, a jurisprudência desta Corte:
AI 5004151-98.2020.4.03.0000. Rel. Des. Fed. INES VIRGINIA PRADO SOARES, e-DJF3 20/11/2020: AGRAVO DE INSTRUMENTO. MULTA PELO ATRASO NO CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO. PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. PRAZO MANTIDO. VALOR DIÁRIO REDUZIDO. - Não há dúvida de que é possível fixar multa diária por atraso na implantação de benefício previdenciário, em razão de tratar-se de obrigação de fazer, não existindo qualquer ilegalidade quanto à sua aplicação, já que se trata de meio coercitivo autorizado por lei, que visa assegurar aefetividade no cumprimento da ordem expedida (art. 536, §1º, do CPC),desde que respeitado oprincípio da proporcionalidade e razoabilidade, podendo ser modificada, tanto no valor quanto no prazo, até mesmo de ofício pelo Magistrado, se se mostrar excessiva, nos termos do art. 461, § 6º do CPC/73 e art. 537, § 1º do atual CPC. - A multa por descumprimento da obrigaçãopossui função meramente intimidatória, não podendo ser aplicada comoreparadora de danos, devendoguardar proporcionalidade e razoabilidade com o bem jurídico tutelado,de modo que a quantia fixada não pode resultar em benefício econômico que supere a própria obrigação, sob pena de locupletamento indevido do credor. - O cumprimento da obrigação, após o prazo razoavelmente fixado sem justificativa concreta, não pode eximir o executado do pagamento da multa, sob pena de esvaziar seu objetivo. - Com base nisso, no caso dos autos, entendo que o valor diário da multa fixado na sentença (R$ 200,00 - observado o limite de 10 salários-mínimos), mostrou-se excessivo, frente ao valor do benefício (aproximadamente um salário-mínimo e meio), devendo ser reduzido para R$ 100,00 (cem reais) por dia de atraso, a fim de afastar um enriquecimento sem causa. - De outro lado, o prazo de 15 dias mostrou-se razoável frente ao tempo decorrido e motivo protelatório para cumprimento da obrigação, guardando, na singularidade do caso, proporcionalidade e razoabilidade com o bem jurídico tutelado. - Ressalta-se que a determinação para cumprimento da obrigação foi proferida em 06/2019, e somente foi adimplida, após aproximadamente 05 meses, e ainda assim, com relevante atraso, após o prazo de 15 dias e pena de multa determinado na decisão de 08/2019. - Agravo de instrumento parcialmente provido, para reduzir o valor diário da multa".
No caso concreto, a r. sentença, proferida em 22/08/2023, determinou a implantação do benefício no prazo de 30 (trinta) dias úteis, sob pena de multa diária a ser fixada em caso de descumprimento. A intimação do cumprimento ocorreu em 05/09/2023 e o cumprimento da obrigação deu-se em 02/10/2023, portanto, dentro do prazo atribuído, não merecendo prosperar o requerimento da apelante de exclusão da multa diária ou fixação de prazo razoável, visto que a implantação do benefício se realizou adequadamente. Portanto, não incide multa, e a questão lateral trazida é simplesmente inaplicável e impertinente.
Quanto ao pedido de isenção das custas, a autarquia apela pleiteando a isenção, contudo, a pretensão do INSS não merece acolhimento. Embora o artigo 4º, I, da Lei 9.289/1996, de fato, isente as autarquias federais do pagamento de custas processuais na Justiça Federal, o § 1º do artigo 1º da mesma lei estabelece que, nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual, no exercício da jurisdição federal delegada, as custas serão regidas pela legislação estadual. No caso dos autos, a demanda tramitou perante a Justiça Estadual do Mato Grosso do Sul, e a Lei Estadual 3.779/2009, em seus artigos 24, §§ 1º e 2º, afasta a isenção de custas para as autarquias previdenciárias.
Desse modo, o INSS não goza de isenção de custas processuais no âmbito da Justiça Estadual de Mato Grosso do Sul, devendo, no entanto, ser ressalvada a obrigação de reembolsar eventuais despesas adiantadas pela parte vencedora, o que não se aplica à hipótese, por ter sido deferida a justiça gratuita à parte autora (ID 281805865, f. 12-14). Assim, a condenação do INSS ao pagamento das custas processuais deve ser mantida, conforme a legislação estadual aplicável.
Mantenho a condenação da verba honorária.
Ante o exposto, rejeito a matéria preliminar e dou provimento parcial à apelação para determinar que o pagamento do benefício perdure por apenas 20 (vinte) anos, visto que a condição da autora apelada está enquadrada no artigo 77, V, alínea "c", item 5, da Lei 8.213/1991, readequando, de ofício, os critérios estipulados para juros e correção, consoante acima delineados.
É o voto.